Numa bela manhã de julho, levanto da cama guiada por
mãozinhas convictas. Sentindo o ar frio do inverno, titubeio. – Vem, mamãe,
vem! – O tom infalível atropela minha preguiça. Seguimos os dois para seu
quarto. Lá ele se ocupa com brinquedos, independente de mim.
Empurra, amassa, embaralha, encaixa, cria. Espírito absorvido. – Guilherme? – Inútil
chamar. Tudo que consigo é um olhar abotoado por fração de segundo. Insinuo um movimento.
– Não, mamãe, fica? – Ah, eu fico! Pego um livro na sua estante e começo uma leitura
em voz alta.
Numa bela manhã de setembro, a velhinha levanta-se da cama,
cafunga e... Nada. Continuo contando canários amarelos, gansos brancos,
galinhas pintadas, gatos pretos, porcos barrigudos e vaca marrom. No meio da
bicharada, ele para de brincar e me dá as costas. Sinto-me música de elevador.
Pelo menos a colheita dos velhinhos é boa. Viro a página.
Numa bela manhã de março... Continuo? Sim. Agora eu quero
saber o fim da história! Puxa daqui, estica dali, força de lá, mas Guilherme
não se mexe. Vêm os velhinhos, a vaca marrom, os porcos barrigudos, os gatos
pretos, as galinhas pintadas, os gansos brancos, os canários amarelos e vai embora
meu fôlego. Ainda assim, não se mexe! A velhinha traz o rato e chego às últimas
páginas.
POP! O nabo gigante sai do buraco. – Viva o ratinhooooo!!! –
O grito de Guilherme me derruba da cadeira. Bichos, velhinhos, o livro e meu
menino, todos em cima de mim. Caímos em deliciosa gargalhada. – “Quelo” mais! –
Como não? Recomeço, releio. Repito diversas vezes, recompensada por ter
abandonado tão cedo meu edredom para partilhar leitura, mesmo sem me dar conta
disso.