domingo, 18 de dezembro de 2022

A moça tecelã


Com a proximidade do Natal, preciso deixar essa dica. Não se trata de novidade, mas de uma obra essencial. "A moça tecelã" (Global), de Marina Colasanti, com bordados deslumbrantes das irmãs Dumont sobre desenhos de Demóstenes Vargas, é um livro que dou de presente com frequência. Segue uma breve análise do conto para justificar meu encantamento. 

Os dois primeiros parágrafos trazem a rotina tranquila e autossuficiente da moça, que tece não só seus dias e noites como tudo o que precisa para viver bem. É o estado inicial da história, de estabilidade e equilíbrio. “Assim, jogando a lançadeira de um lado para outro e batendo os grandes pentes do tear para frente e para trás, a moça passava os seus dias. Nada lhe faltava.” 

No terceiro parágrafo também ela mesma produz a força transformadora da história: a solidão e a necessidade da companhia de um marido. Daí o equilíbrio do estado inicial termina. “Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer. Mas tecendo e tecendo, ela própria trouxe o tempo em que se sentiu sozinha, e pela primeira vez pensou em como seria bom ter um marido ao lado. Não esperou o dia seguinte.” 

Nos parágrafos seguintes, vem a dinâmica da ação. A moça tece o marido que desejou, que entra sem pedir licença em sua vida e a faz feliz por algum tempo. Ela pensa em ter filhos, mas, assim que ele percebe o poder do tear, seu amor pela tecelã se transforma em ambição. Exige luxos mil e passa de companheiro a carrasco em poucas linhas. “A noite chegava, e ela não tinha tempo para arrematar o dia. Tecia e entristecia, enquanto sem parar batiam os pentes acompanhando o ritmo da lançadeira. Afinal o palácio ficou pronto. E entre tantos cômodos, o marido escolheu para ela e seu tear o mais alto quarto da mais alta torre. — É para que ninguém saiba do tapete — ele disse. E antes de trancar a porta à chave, advertiu: — Faltam as estrebarias. E não se esqueça dos cavalos!” 

No penúltimo parágrafo, ela mesma, de novo, produz a força equilibrante da história: a tristeza e a vontade de estar sozinha novamente. “Tecer era tudo que fazia. Tecer era tudo que queria fazer. E tecendo, ela própria trouxe o tempo em que sua tristeza lhe pareceu maior que o palácio com todos os seus tesouros. E pela primeira vez pensou em como seria bom estar sozinha de novo. Só esperou anoitecer.” O último parágrafo traz o estado final da história, a moça desfaz tudo o que teceu para ter companhia, inclusive o marido, que quando se dá conta, desaparece da cena, restaurando o equilíbrio perdido do início. “Rápido, o nada subiu-lhe pelo corpo, tomou o peito aprumado, o emplumado chapéu. Então, como se ouvisse a chegada do sol, a moça escolheu uma linha clara. E foi passando-a devagar entre os fios, delicado traço de luz, que a manhã repetiu na linha do horizonte.” 

Marina Colasanti, nesse conto, faz um discurso extremamente feminista – sem qualquer indício de panfletagem – através de uma narrativa linda, plena de metáforas. Nela, a força de vontade da mulher está representada pelo tear. O marido, muitas vezes uma imposição da sociedade para as mulheres, outras vezes uma necessidade real e sem volta, nessa história mostra-se coadjuvante facilmente descartável quando incomoda a paz da companheira.

Assim, analisando criticamente a narrativa, pelo discurso embutido para a livre interpretação do leitor, fica claríssima a intenção de mostrar que uma mulher pode ser a dona de sua própria história. Em “A moça tecelã” a protagonista produz não só seu sustento, suas vontades, seus bens, seus males e sua vida inteira, como também os cenários onde ela quer estar. Ela dá o tom, planeja, executa. Ela escreve o roteiro.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

Memórias

Minha história de leitura, pelo que me lembro, começa com os livros e gibis por assinatura. Graças a meus pais, virei fã das coleções e, sobretudo, das turmas. A do Marcelo, Marmelo, Martelo (Ruth Rocha),...

...a do Menino Maluquinho (Ziraldo), ...

...a da Laurinha (Jane Carruth)...

e a dos personagens de Walt Disney, todas do Círculo do Livro, ... 

...a da Mônica (Mauricio de Sousa), ...

a da Luluzinha (Marjorie Henderson Buell), ... 

 ...a do Lambe-lambe (Daniel Azulay)...

Não é à toa que faço parte de diversas turmas – algumas bem antigas – e adoro cada uma delas. A da infância/adolescência, a do CEFET, a da faculdade, as do trabalho, a da literatura. Meu irmão costumava dizer que eu gosto mais dos amigos do que da família. Ciúme de irmão, claro. Mas é verdade que, apesar de muito tímida, quando monto uma patota eu me agarro nela e não largo mais!

Na infância eu lia, mas também ouvia muitas histórias. Tínhamos alguns discos coloridos de vinil, da “Coleção Disquinho”, com diversas narrativas musicadas, na maior parte compostas e adaptadas pelo João de Barro, o Braguinha, que quase furaram de tanto tocar na vitrola. Dessas, as que mais me lembro são “A festa no céu” e a “História da Baratinha”. Eu ficava arrasada com o triste fim dos personagens, mas não parava de repetir. 


Tinha uma que eu só ouvia através do meu pai, que contava tocando piano: “Zé Carrancudo”. Ele fazia as entonações, tocava as músicas na hora certinha, criava o clima todo. Nunca cansei de ouvir. Até hoje peço para ele contar/tocar, com a desculpa de que é para o Gui ouvir. Mas é a filhota aqui quem mais vibra. Essa narrativa, ao contrário das duas citadas da “Coleção Disquinho”, tem final feliz, apesar de ser tensa até o desfecho. Tentei encontrá-la em áudio por muito tempo, mas só achei em 2020, no Youtube. Ao ouvi-la no original, pela primeira vez, aos 41 anos, eu me emocionei. Meu pai contando é muito melhor.

As histórias lidas e ouvidas na infância me fizeram ser amante da música e sonhar em ser ilustradora. Toco piano, mas a timidez não me permite fazer o que meu pai faz. Para contadora de histórias, infelizmente não sirvo. Meu objetivo, quando menina, era um dia trabalhar com o Mauricio de Sousa ou nos Estúdios Disney. Cheguei perto! Escolhi estudar Design na ESDI e meu primeiro estágio profissional foi no estúdio de cinema de animação Animagem, com o grande Rui de Oliveira! Uma experiência incrível que guardo no coração. 




Hoje escrevo, ilustro e diagramo. Produzo meus livros do início ao fim. Não tem como dizer que não fui influenciada pelos livros da infância. Eu me identificava tanto com as personagens quanto com aqueles que as criavam. Queria saber quem eram, sua biografia... Colecionava narrativas.

Na adolescência apareceu a Coleção Vagalume. As tramas me pegavam de um jeito que eu não esperava. Foi quando a narrativa passou a ter mais força que a parte visual dos livros para mim. 


Depois, pelo clube de assinatura Círculo do Livro, conheci Sidney Sheldon, que me fez esquecer completamente das ilustrações durante a leitura. Naqueles livros de suspense, cujas personagens principais eram mulheres fortes e cheias de sensualidade, descobri que uma menina pode ser a heroína da sua própria história. Havia diversos trechos um tanto pesados para uma adolescente, mas, por isso mesmo, devorei com avidez. Tudo. Toda a obra dele.


Ainda hoje fico tentando ler até "esgotar” as obras dos autores com os quais me identifico. Não por capricho, mas por necessidade. Assim eu os conheço melhor, mergulho no universo de cada um e me pego imersa no meu também.

terça-feira, 8 de novembro de 2022

Uma resenha de peso!


Estou num misto de orgulho e euforia. Lançar mais um livro, todinho do jeito que sonhei, já é uma maravilha sem tamanho. Mas ver minha mestra de LIJ, Ninfa Parreiras, grande poeta, conselheira, amiga querida que tanto admiro, falar sobre esse livro no canal dela de forma tão espontânea... é simplesmente indescritível.

Assisti ao vídeo inúmeras vezes, tentando entender minha emoção para colocar em palavras aqui. Não consegui. Só me vem uma à cabeça: gratidão. Obrigada, Ninfa, por tudo que me ensina, pela sua amizade e generosidade. Obrigada por mais esse carinho.❤️

domingo, 6 de novembro de 2022

Cartas sem resposta

Como se já não bastasse a alegria de ter lançado recentemente meu novo infantil, aconteceu ontem o lançamento de "Cartas sem resposta", organizado pela Ninfa Parreiras. Nele tem carta para Cecília Meireles, Augusto dos Anjos, Drummond, Cora Coralina, Suassuna, Bartolomeu Campos de Queirós, Esopo, Fernando Pessoa, Rilke, Sylvia Orthof, entre outros grandes. Estou no time dos remetentes, ao lado de escritores que moram no meu coração. A minha carta, é para Guilherme de Almeida.

"(...)
Ciente da minha paixão por teus versos, meu amor de carne e osso não só aprovou, como me presenteou com uma bela edição de teus melhores poemas ('melhores' segundo o organizador, claro, uma vez que o meu predileto não consta na seleção - mas disso meu bem não precisa saber). Ele talvez jogue xadrez... e possua a perspicácia de quem conhece seus adversários. Tu sempre foste aliado. És, em verdade, a lua dos namorados!
(...)"

"Cartas sem resposta" é resultado de um trabalho feito em conjunto com paciência e muito amor. Demorou anos para sair, mas saiu num capricho só!

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Doce surpresa

R$ 45,00  com frete grátis para o Rio de Janeiro

Para adquirir o livro, basta mandar uma menagem para mim pelo lmperalva@gmail.com. Se você não estiver no Rio de Janeiro, a gente combina! ;)

"O que acontece quando as pessoas divergem e não conseguem decidir sobre algo? Com essa questão em mente, a turma de uma escola se vê diante do impasse e acaba encontrando a oportunidade de descobrir os sentidos de uma palavra muito importante: democracia. O texto de Luciana Peralva é o quitute literário que convida o leitor a pensar sobre os temas mais fundamentais de uma nação. Os personagens crianças têm a chance de fazer o que muito adulto ainda não entendeu ser possível. Num país com tanta dificuldade de lidar com o passado (e o presente) autoritário, Doce Surpresa tem gosto de esperança. É para saborear com o coração pronto para a renovação." 

Doce surpresa traz um conto sobre democracia, generosidade, doces e, sobretudo, da pureza do olhar das crianças. A quarta capa (parágrafo acima) é do meu amigo querido Ricardo Benevides e, as últimas páginas, guardam uma surpresinha... a receita de uma sobremesa deliciosa: Morango Mulato.

domingo, 16 de outubro de 2022

Lançamento de "Doce surpresa"

 

Foi uma tarde linda. Um lançamento cheio de pessoas queridas, representantes mais que especiais de todas as minhas tchurmas: família, infância, CEFET, ESDI, Ancine, Arquivo Nacional, escola do Gui, literatura... 🥰 Só tenho a agradecer. Não caibo em mim de tanta alegria. Obrigada, Pequeno Benjamim Livraria / Livraria Lima Barreto, por tornar isso possível. ❤️🍓🍫🎉 

Ah! Pra quem quiser ver o lançamento quase na íntegra, o vídeo está no perfil da livraria Pequeno Benjamim e no meu Leituras Peraltas, no Instagram.😘

sexta-feira, 7 de outubro de 2022

O dia mais frio do ano


"Cachinhos Pretos não sabia mais o que fazer. Sentou-se sobre um dos pés do Ogro e começou a chorar, porque não queria que ele morresse congelado. (...) Com medo de assustá-la, [o Ogro] começou a mexer seu pé bem devagar. Parecia uma cadeirinha de balanço. Cachinhos Pretos sorriu. O Ogro também sorriu. Levou Cachinhos Pretos para bem perto do seu coração e deu um abraço desajeitado. Ela retribuiu e desconfiou que há muito tempo o Ogro não era abraçado. Nessa hora, uma lágrima derreteu."

"O dia mais frio do ano" (Rocquinho), de Andrea Viviana Taubman e Anna Claudia Ramos, ilustrado por Carol Rempto, conta a história do dia em que a menina Cachinhos Pretos, arrastada por um vendaval, encontra a casa de um ogro azul, quase congelado, no alto de uma montanha. O isolamento não faz bem para ninguém. Nem para o ogro! Cachinhos pretos traz calor, carinho, alegria e amigos para a vida dele, que se revela um grande confeiteiro.

"Mamãe, eu já joguei o lamabol! Só que com farinha!" Foi o comentário do Gui, ao conhecer as regras do jogo que o ogro gostava de jogar. Ê, bagunça boa! 😊

Foram os amigos que tiraram o ogro do isolamento e o trouxeram de volta à vida. Gui respirou aliviado: "ainda bem que eu sou um especialista em fazer amigos!" Ainda bem. E agora, mais do que nunca, todos sabemos o valor de um abraço.

sexta-feira, 30 de setembro de 2022

A ponte

 



"Clavo mi remo en el agua
Llevo tu remo en el mío
Creo que he visto una luz
al otro lado del río

El día le irá pudiendo
poco a poco al frío
Creo que he visto una luz
al otro lado del río

Sobre todo creo que
no todo está perdido
Tanta lágrima, tanta lágrima
y yo, soy un vaso vacío

Oigo una voz que me llama
casi un suspiro
Rema, rema, rema-a 
Rema, rema, rema-a"

Trecho da música Al outro lado del rio, de Jorge Drexler



Na terça-feira passada, fui a uma reunião na escola do meu filho para saber como será o último trimestre do ano para a turma dele. O que será trabalhado e o que se espera. A professora começou sua fala de uma maneira que nem eu nem os demais pais presentes esperávamos. Passou para nós a mesma atividade que havia proposto às crianças naquele dia. Fez a leitura do livro “A ponte” (Callis), de Eliandro Rocha, ilustrado por Paulo Thumé, e nos pediu para escrever, num pedacinho de papel, o que considerávamos importante para “construir pontes”.

O livro apresentado fala do coelho Nestor, que vivia tranquilamente sozinho no seu canto da floresta até um estranho se mudar para pertinho dele, do outro lado do rio. Nestor não gostava nada da situação. Perdeu sua privacidade e o silêncio que amava para ler seus livros. No entanto, no fim, ele constrói uma ponte para conhecer melhor o vizinho e percebe o quanto estava errado sobre ele. Linda mensagem. Gostei tanto da leitura como da atividade proposta pela professora e escrevi no papelzinho que, na minha opinião, para “construir pontes”, é preciso humildade e paciência.

Hoje, após a leitura do ensaio “Direito à Literatura”, de Antonio Candido, percebi uma relação interessante entre ele e a mensagem do livro lido pela professora do Gui na reunião de pais. Falar de direitos humanos no Brasil é tarefa difícil por se tratar de um assunto extremamente controverso. “(...) Porque pensar em direitos humanos tem um pressuposto: reconhecer que aquilo que consideramos indispensável para nós é também indispensável para o próximo. (...) Na verdade, a tendência mais funda é achar que os nossos direitos são mais urgentes que os do próximo.” Seria a literatura indispensável?

Antonio Candido visualizou a relação da literatura com os direitos humanos através de dois ângulos: “primeiro verifiquei que a literatura corresponde a uma necessidade universal que deve ser satisfeita sob pena de mutilar a personalidade, porque pelo fato de dar forma aos sentimentos e à visão do mundo ela nos organiza, nos liberta do caos e portanto nos humaniza. Negar a fruição da literatura é mutilar nossa humanidade. Em segundo lugar, a literatura pode ser um instrumento consciente de desmascaramento, pelo fato de focalizar as situações de restrição dos direitos, ou de negação deles, como a miséria, a servidão, a mutilação espiritual. Tanto num nível quanto no outro ela tem muito a ver com a luta pelos direitos humanos.”

Então, sim, a literatura é indispensável, um bem humanizador. No entanto, “em nossa sociedade há fruição segundo as classes na medida em que um homem do povo está praticamente privado da possibilidade de conhecer e aproveitar a leitura de Machado de Assis ou Mario de Andrade. Para ele, ficam a literatura de massa, o folclore, a sabedoria espontânea, a canção popular, o provérbio. Estas modalidades são importantes e nobres, mas é grave considerá-las como suficientes para a grande maioria que, devido à pobreza e à ignorância, é impedida de chegar às obras eruditas. (...) a experiência mostra que o principal obstáculo pode ser a falta de oportunidade, não a incapacidade. (...) é revoltante o preconceito segundo o qual as minorias que podem participar das formas requintadas de cultura são sempre capazes de apreciá-las, o que não é verdade. As classes dominantes são frequentemente desprovidas de percepção e interesse real pela arte e a literatura ao seu dispor, e muitos dos seus segmentos as fruem por mero esnobismo, porque este ou aquele autor está na moda (...)”.

Deixamos de construir muitas pontes por falta de humildade, por achar que conhecemos o outro e suas necessidades. Antonio Candido encerra seu belo ensaio dizendo que “a fruição da arte e da literatura em todas as modalidades e em todos os níveis é um direito inalienável.” Concordo com ele. Uma sociedade igualitária só será possível quando as pessoas começarem a se enxergar sem as lentes do preconceito. Rememos. Quem sabe um dia chegamos ao outro lado do rio?

segunda-feira, 26 de setembro de 2022

Bruxas e chocolate

“Ao longe, o relógio de uma igreja começou a bater dez horas.
Devagar, rangendo as dobradiças enferrujadas, os grandes portões de ferro da fábrica começaram a se abrir.
A multidão silenciou de repente. As crianças pararam de correr de um lado para o outro. Todos os olhos se fixaram nos portões.
- La está ele! – alguém gritou. – É ele!
E era ele mesmo”

Então perguntei ao Gui:
- Ele quem, filho?
- Willy Wonka!!

Com o passar dos anos, vou tentando fazer leituras mais longas com meu pequeno. Aos oito anos, ele acompanha bem histórias maiores, lidas aos poucos. Dois ou três capítulos por noite.

Gosto muito desses dois livros do Roald Dahl, ilustrados pelo Quentin Blake: “A fantástica fábrica de chocolate” e “As bruxas”. Meus exemplares são edições antigas da Martins Fontes.

Tentei começar pelo segundo, mas não deu muito certo. Apesar de ser engraçado e intrigante, como o texto demora a engrenar, o Gui perdia o foco, dormia com facilidade (olha a dica!) e não conseguimos chegar juntos à parte mais dinâmica da história. Achei que, pelo fato de ser sobre bruxas e “saber reconhecê-las por aí”, seria um sucesso com o Gui, mas não rolou.

Acontece que o outro livro, “A fantástica fábrica de chocolate”, está sendo uma delícia de ler com ele. E não é porque a história engrena mais rápido. Demora também. O trunfo, nesse caso, é o filme. O Gui já deve ter visto umas cinco vezes e adora. Então ele acompanha, percebe as diferenças entre o livro e o filme, fica curioso, pede para ler mais do que o combinado para aquela noite...

Aí é que está: você sabia que existe um filme baseado no livro “As bruxas”? Eu soube recentemente. É de 2020. Chama-se “As bruxas de Roald Dahl”. Assisti ao trailer e aposto que o Gui vai gostar. Depois de ver esse filme, garanto que a leitura do livro será bem diferente. Terei que arranjar outro para ter “efeito sonífero”.
😅

sexta-feira, 24 de junho de 2022

O menino Sabino


Não me lembro de quando li "O menino no espelho" pela primeira vez. Na adolescência? Sei que minha paixão pela obra de Fernando Sabino começou depois que comecei a me aprofundar em Literatura, já adulta. Conhecer gêneros literários, autores, os clássicos... Daí me caiu nas mãos um livro de bolso "Os melhores contos de Fernando Sabino" e foi amor à primeira leitura. Desconfio que nunca ri tanto lendo, como no conto "Como nasce uma história". Amo textos assim, capazes de me mudar o humor, deixar meu riso solto.

No último feriado reli "O menino no espelho" na paz da serra e além de rir, eu me emocionei. Estava curtindo ver meu filho brincar livre e solto com outras crianças na natureza (sem videogame ou tv pra abduzi-lo)... Caiu tão redonda essa leitura! Parecia que era a primeira vez. Como pude apagar esse romance da memória? Não deve ter me marcado tanto antes... Quando tentava lembrar, confundia o Fernando (personagem principal) com o Eduardo Marciano, de "O encontro marcado". Nada grave, uma vez que os dois têm muito em comum e ambos são personagens autobiográficos. 

A história começa com um mistério, termina com seu desvendar e entre o prólogo e o epílogo, é como uma coletânea de contos que se passam com os mesmos personagens em sequência, pois todos os capítulos são independentes. Memórias do menino Fernando. Refleti tanto enquanto lia, olhando as colinas verdes à minha volta... Se Sabino fez metade das traquinagens relatadas naquelas páginas... mesmo que tenha imaginado boa parte delas e não passem de "lorotas" como o próprio autor confessa no final, ele foi, sem dúvida nenhuma, um menino feliz. 

Acredito que as leituras que fazemos não são por acaso. Elas acontecem no momento certo. As que nos afetam, claro. Então pensamos: "por que não li esse livro antes?" Porque não teria o mesmo efeito. Seria apenas mais um. Lido na hora certa, ele cumpre seu papel. Vários outros aguardam seu momento na estante. Espero ter mais surpresas tão agradáveis quanto a desse feriadão. Novamente Fernando Sabino temperou meus dias. Minha paixão cresceu, assim como a certeza de que a infância é a fase mais linda da vida.

quinta-feira, 23 de junho de 2022

Onde tem bruxa tem fada...



"Eles diziam onde as pessoas deveriam guardar seu dinheiro. Então o dinheiro crescia, crescia, crescia e ficava tão forte e valioso que os homens podiam comprar tudo: casa, carro, viagem, roupa, voto, poder, glória 'sem entrada e sem mais nada'.
A fada do céu sentiu que não tinha tamanhos poderes. Seus encantamentos só eram coisas de alegrar coração...
(...)
Os mágicos - prometendo o céu na Terra - davam tantas tarefas aos homens que eles não tinham tempo para saber que faltava tempo para a alegria nascer."

"Onde tem bruxa tem fada..." (Moderna), com ilustrações da Suppa, foi meu primeiro livro do Bartolomeu Campos Queirós. Não por acaso.

Os textos desse autor, cuja fala era hipnotizante (tive o prazer de ir a uma palestra dele num dos salões da FNLIJ), são todos repletos de poesia e brincadeiras com as palavras. Confesso que ele não é dos meus preferidos, mas reconheço sua grande importância na LIJ brasileira.

No entanto, esse livro em especial me afeta bastante por conta do tema. E, pelo visto, Gui também curte. Ontem pediu para ser o livro da nossa hora da leitura pela terceira vez em uma semana.

A história traz um retrato bem triste da nossa sociedade consumista. Fala dos "mágicos" que nos prometem mundos e fundos e da esperança venenosa e viciante cultivada por eles. Quem só espera nunca alcança e esquece de sonhar, imaginar... A ponto de não saber o que pedir quando uma fada aparece.

"- Peçam viagens ao centro das sementes para ver a árvore antes de nascer. Peçam ruas cobertas de música para o caminho ser canção. Ou, quem sabe, livros com folhas brancas para os olhos inventarem as histórias!"- sugeria a fada. Mesmo assim, as crianças desconfiam. "- Quanto custa, quanto?"

De amargar... porque é real. Talvez o Gui ainda não alcance a mensagem desse livro. Talvez ainda acredite em fadas e se deixe encantar se algum dia uma aparecer na sua frente. É o que eu desejo.

domingo, 5 de junho de 2022

O gato e o diabo


"O Diabo contou para o Senhor Prefeito o que tinha lido nos jornais e disse que estava disposto a construir uma ponte em Beaugency para que o povo todo pudesse atravessar o rio quantas vezes quisesse.
Disse que podia construir uma ponte tão boa quanto a melhor que existia no mundo, e mais: podia construí-la numa só noite! O Prefeito perguntou ao Diabo quanto é que custaria aquela maravilha.
- Dinheiro nenhum - respondeu o Diabo. - Faço tudo de graça. Só quero uma coisa: o primeiro que atravessar a ponte vai me pertencer.
- Combinado - disse o Prefeito."

Ontem na hora da leitura teve "performance" do Gui. Quando me mostrou o livro que tinha escolhido, tive um ataque de riso! Esse é um dos nossos clássicos mais queridos: "O gato e o diabo" (saudosa Cosac Naify), do James Joyce, traduzido pela Lygia Bojunga, com as fantásticas aquarelas do Lelis.

A malícia de um chefe do Executivo pode surpreender até mesmo o cão-tinhoso em pessoa! Um lindo livro de capa dura, bizarro, divertido e... instrutivo! 

Infelizmente a Cosac Naify não existe mais, mas na Estante Virtual você certamente acha alguns exemplares desta belíssima edição.

sexta-feira, 27 de maio de 2022

Eva Furnari

No domingo estava falando sobre ela com minha amiga Isabel de Paiva. Ela é o que consideramos autora de literatura infantil ideal. O texto é ótimo, engraçado, educativo sem ser chato, as ilustrações são bonitas e esquisitas ao mesmo tempo, hilárias, originais, tudo de bom. A Eva Furnari é um exemplo pra nós. Indico os livros sem titubear.

Eu disse à Isabel que "devo ter uns 20". Então, Zabel, tenho 21! Porque o Felpo Filva foi adotado pela escola este ano. Pretendo ter todos. Gui ADORA os livros dela! (Maroca também)

Na foto estão (na ordem de preferência do Gui):
1) Cacoete
2) Sorumbática
3) Marilu
4) Rumboldo
5) Pandolfo Bereba
6) Trudi e Kiki
7) Drufs
8)Os problemas da família Gorgonzola
9) Lolo Barnabé
10) Tartufo
11) Dalfonsinho
12) Cocô de passarinho
13) Não confunda
14) Assim assado
15) Travadinhas
16) Nós
17) A bruxa Zelda e os 80 docinhos
18) O feitiço do sapo
19) Bruxinha Zuzu
20) Zig-zag

O Felpo Filva, se estivesse aqui, ficaria em oitavo.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

Quando a Morte faz papel de boba


"Certa noite, bateram na porta de sua casa. Era a Morte vestida com uma capa preta.- Zé, pode se preparar. Sua hora chegou - disse ela segurando uma foice.
- Mas como! - exclamou ele espantado. - Já? Deve haver algum engano! Ainda me sinto tão bem!
A Morte não era de muita conversa.
- Se está pronto, vamos.
Zé Malandro baixou a cabeça.
- Posso fazer um último pedido?"

Olha, preciso dizer... que livro supimpa! "Contos de enganar a morte" (Ática), de Ricardo Azevedo, envolve a gente e rende boas gargalhadas. São quatro contos sensacionais nos quais a Morte é descaradamente enrolada por personagens bem malandros e destemidos, que não estão nada a fim de ir com ela para o outro mundo.

As ilustrações, do próprio autor, são poucas, mas suficientes. Lembram xilogravuras e combinam demais com o clima das histórias.

Gui e eu adoramos! Lemos um conto atrás do outro, sem parar e, como o próprio livro diz, "o tempo, quando vai se ver, já passou"!