A temática do envelhecimento humano está bem presente na minha vida há algum tempo, por conta da proximidade que eu tinha com a minha avó materna, com quem eu me identificava muito, por conta de uma aula a que assisti do grande escritor e professor Affonso Romano Sant'Anna, na qual ele se perdeu diversas vezes (já estava claramente doente), por conta do meu pai, que acabou de ser diagnosticado com um início de Alzheimer e demência... Eu já vinha reparando que ele está se tornando mais apático, sem vontade, repetitivo, alheio. Está desabitando, aos poucos, seu próprio corpo. Às vezes não o reconheço. Li há poucos meses um livro maravilhoso da Rosa Montero, "A boa sorte", no qual ela afirma que "envelhecer é ser ocupado por um estranho".
Precisamos com urgência de uma mudança na representação social da pessoa idosa e a literatura infantil contribui muito para isso, apresentando nosso orgulho e respeito pelos mais velhos, mostrando-os como nossos pagés, nossos oráculos, sua imensa importância na sociedade e, ainda, abordando com lirismo as doenças ligadas ao envelhecimento e as formas de lidar com elas. Já li vários espetaculares. Um deles é o livro-imagem "Minha vó sem meu vô" (Miguilim), de Mariângela Haddad.
Trata da história de um casal de velhinhos que tem uma maneira toda especial de lidar com o esquecimento e as perdas. O avô começa a agir de um jeito esquisito e a avó faz bilhetinhos para lembrá-lo da função de cada objeto. Tudo sob a ótica de uma criança. É de chorar de tão lindo.
Minha avó era força que unia minha família, que se dispersou após seu falecimento. As aulas (em classe ou contidas nos livros) do mestre Affonso Romano Sant'Anna foram memoráveis e super enriquecedoras para mim. Todas. Meu respeito e admiração por ele só cresceram depois daquela última que citei. Espero que esteja bem. Quanto a meu pai, músico com vasto repertório, com quem eu aprendi boa parte do que eu sei sobre música, estamos fazendo de tudo para não deixar o estranho ocupar seu corpo.
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