quinta-feira, 24 de setembro de 2020

60 contos diminutos

"Bateu a porta do quarto com força e riscou a frase com raiva sobre o papel.
ODEIO MINHA MÃE
Ficou olhando as letras com os olhos semicerrados, a respiração pesada.
Se jogou na cama soltando um resmungo. Amassou o papel com violência e enfiou num canto da cama debaixo do colchão. Ficou olhando pro teto sentindo o ódio arder por dentro até explodir numa lágrima que molhou o travesseiro. Ficou ali imóvel, o corpo tenso enquanto ouvia o pai e a mãe conversando baixo e se preparando para dormir. A luz do corredor apagou. Silêncio total.
Como ela consegue?!
Fritou na cama por muito tempo. O pensamento agitado, as frases de revolta gritando lá dentro. Precisava beber água! No caminho da cozinha parou em frente à porta do quarto de casal. A mãe dormia tranquilamente ao lado do pai.
Se aproximou silenciosamente dela e ficou em pé ao seu lado observando seu sono.
Como ela consegue?!
Então, como um lagarto, se enfiou lentamente debaixo do braço da mãe e adormeceu."

Gente, esse miniconto acaba comigo. Choro horrores! Não é lindo? Aliás, esse livro é uma pérola, um juvenil que eu amo e indico sempre. Pra rir, chorar e se apaixonar.

"60 contos diminutos" (Ed. Gaivota), da Marília Pirillo, é uma obra de pequenos textos do cotidiano, na forma simulada de um simpático moleskine, todo escrito e desenhado com esferográfica azul, como um caderno de adolescente.

Quando o li pela primeira vez, comentei à beça com minhas amigas do curso de literatura. O mais interessante foi que cada uma tinha um predileto diferente. O que não me surpreende, porque o livro é todo uma delícia.

Ontem peguei "60 contos diminutos" pra ler de novo. Como estou em outra fase da minha vida, outras partes do livro me afetaram. Um deleite. O que é realmente bom não perde a graça.

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